Aos 84 anos, mãe do vereador Professor Gilmar, recebeu o Título de Cidadã Petrolinense e a Medalha Dom Malan em meio a música, poesia e reconhecimento por uma vida dedicada à transformação social
Nesta sexta-feira (25), a Câmara Municipal de Petrolina concedeu à senhora Maria Diuza dos Santos, mãe do vereador Professor Gilmar-PT, as suas maiores honrarias: o Título de Cidadã Petrolinense e a Medalha de Honra ao Mérito Dom Malan. A homenagem reconhece a trajetória de vida de Dona Diuza, marcada por resistência, solidariedade e compromisso com a coletividade, especialmente nas periferias da cidade, onde vive há mais de quatro décadas.
A cerimônia foi realizada na Associação das Mulheres Rendeiras do bairro José e Maria, local de luta, afeto e formação da homenageada, onde dedicou grande parte da vida ao fortalecimento de mulheres periféricas por meio do trabalho digno e da construção coletiva.
O evento lotou o espaço e emocionou a todos os presentes. Dona Diuza chegou no salão acompanhada de seus netos e familiares, em uma entrada marcada por grande comoção. Foi homenageada pelas amigas da Associação, Dona Santinha e Dona Angelita, além da roteirista Dione Carlos, que acompanhada pelo sanfoneiro Iván Greg, interpretou a música Maria Maria, celebrando sua trajetória de força e ternura. Antes do discurso oficial, a cerimônia foi encerrada com o vereador Professor Gilmar, seu filho e autor da proposição, recitando uma poesia autoral dedicada à mãe, um momento de intensa emoção e gratidão compartilhada com todos os presentes.
O coração que floresce
Na casa de Dona Diuza, as plantas têm nome, história e propósito. Cada vaso é um pequeno altar onde ela deposita o amor pela terra, o respeito ao tempo e a crença de que a natureza cura. Cultivar não é apenas uma ocupação, é labor, um gesto político, uma forma de cuidado e um jeito de existir no mundo. Como quem rega o futuro com as mãos que um dia enfrentaram a enxada, o fogo do fogão de feira, e as lágrimas silenciosas das perdas.
Maria Diuza dos Santos nasceu entre os ventos e veredas do sertão pernambucano, em 1940, no sítio Baixa Verde, povoado de Santa Filomena (Piauí), onde aprendeu desde cedo a transformar desafios em sabedoria. Casou-se com Euclides Paulo dos Santos, o conhecido e querido “Dió”, com quem construiu uma história de parceria, afeto e resistência. Dessa união nasceram oito filhos: Deomário, Vilanir, Francisca, Adercino, Gilberto, Gildenir, Alzenir e Gilmar. Criaram sete, pois o primogênito faleceu ainda bebê. Cada filho foi uma extensão do amor e da coragem desse casal que, fizeram da vida um exercício constante de entrega e luta.
As dificuldades de criar os filhos na roça, levaram o casal, em 1972, a migrar para Juazeiro, na Bahia. Lá, encontraram na feira uma nova forma de sustento, vendendo alimentos típicos e reafirmando a dignidade do trabalho popular. Em 1979, com a iminente ameaça do rompimento da barragem do São Geraldo, foram obrigados a recomeçar mais uma vez, agora em Petrolina, Pernambuco, onde se fixaram no bairro Jardim Maravilha e viveram por mais de 30 anos. Foi ali, entre barracas, panelas e redes estendidas, que Dona Diuza consolidou seu papel de referência comunitária e materna.
Filha da caatinga, criou seus filhos na labuta da feira do Ouro Preto, no bairro Jardim Maravilha, vendendo buchada, caldo de mocotó e sarapatel, e oferecendo, junto à comida, palavras de coragem e acolhimento. Não foi o sertão que a moldou com dureza, mas ela quem ensinou que, por trás da terra árida, há uma potência de vida esperando por cuidado, por mãos generosas, por fé.
Mesmo diante das maiores dificuldades, nunca abandonou seu profundo compromisso com o amor cristão e a solidariedade. Era conhecida por abrir as portas de sua casa a quem precisasse, gente de Petrolina e de longe, acolhendo, ofertando teto, alimento e palavra amiga, como quem estende um pedaço do próprio coração. Sua religiosidade a guiou pelas missas no bairro Ouro Preto, pelos projetos comunitários, e pelo cuidado com a saúde por meio das plantas medicinais, numa parceria com as Irmãzinhas da Imaculada Conceição. Entre folhas, orações e partilhas, Dona Diuza fez da fé um gesto diário, uma prática viva, ensinando que a palavra de Jesus é sobre cuidar, amparar, dividir o pouco para multiplicar esperança.
No coração de Dona Diuza também floresce a luta constante e fecunda das Mulheres Rendeiras. Desde 2009, ao lado de Angelita e Santinha, ela forma um trio formoso e “quente”, como dizem, tecendo dignidade com as próprias mãos. Na Associação das Mulheres Rendeiras do bairro José e Maria, um quilombo urbano onde, há 27 anos, mulheres transformam o que parece pouco em abundância, Diuza cultiva mais que plantas: cultiva vidas. Lá, entre linhas, agulhas e sonhos, ela fortaleceu gerações de mulheres periféricas, bordando autonomia, trabalho digno e construção coletiva no tecido da resistência.
Não por acaso, Dona Diuza é mãe de Gilmar Santos, Professor Gilmar, que entre os encontros da Pastoral da Juventude do Meio Popular e as partilhas com a mãe, aprendeu que política se faz com gente, com solidariedade, com abraço e com coragem. Sua luta pelas periferias, pelo povo preto, pelas mulheres e pela justiça social é o reflexo vivo do legado materno que carrega. É como se cada passo dado por Gilmar na Câmara, cada lei proposta, cada denúncia feita nas ruas de Petrolina, fosse também um desdobramento das lições que aprendeu com ela: servir, acolher, resistir. A mata que Oxóssi protege é a mesma que Dona Diuza cultiva no coração, com folhas, orações e gestos de amor.
Essa mesma mulher sertaneja e periférica, que caminhou lado a lado com as Irmãzinhas da Imaculada Conceição, que abriu as portas de casa para gente de perto e de longe, é agora reconhecida como símbolo de cidadania e dignidade. O título que Petrolina entrega a Dona Diuza é mais do que uma honraria: é o reconhecimento de que sua história borda, com delicadeza e coragem, o tecido da memória coletiva do povo dessa terra. Com a entrega da Medalha de Honra ao Mérito Dom Malan, a Câmara reconhece não apenas sua trajetória, mas a de tantas outras mulheres que, como ela, movem este país com afeto, resistência e luta.
Por Victória Santana e Glícia Barbosa (ASCOM Mandato Coletivo)
Fotos: Lizandra Martins