Recurso de Flávio Bolsonaro para travar investigação desgasta governo

O pedido feito pelo senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) ao Supremo Tribunal Federal (STF) para a suspensão das investigações relativas a movimentações financeiras de seu ex-assessor Fabrício Queiroz causou mal-estar no Palácio do Planalto. Nos bastidores, auxiliares do presidente Jair Bolsonaro e ministros disseram que a estratégia usada por Flávio tem potencial para provocar mais desgaste ao novo governo.

Ao solicitar a suspensão das apurações, o filho de Bolsonaro alegou que o cargo de senador lhe confere foro especial no STF. Embora não tenha tomado posse – o que ocorrerá em 1.º de fevereiro –, Flávio já foi diplomado.

A argumentação contradiz discurso do presidente, que sempre disse ser contrário ao foro privilegiado. Além disso, houve incômodo no Planalto com o fato de Flávio sustentar que nada tinha a ver com essa situação e agora pedir para que as investigações envolvendo seu ex-assessor fossem suspensas.

Ao conceder a liminar, o ministro Luiz Fux, do STF, disse que deferia a solicitação do senador eleito “até que o relator da presente reclamação [Marco Aurélio Mello] se pronuncie quanto ao pedido de avocação do procedimento e de declaração de ilegalidade das provas que o instruíram”.

A estratégia usada por Flávio foi classificada por dois auxiliares de Bolsonaro como “um tiro no pé”, porque pode contaminar o governo. Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) considerou a movimentação de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz, de janeiro de 2016 a janeiro de 2017, incompatível com seu patrimônio.

Aliados de Bolsonaro afirmaram que Flávio não deveria ter recorrido ao STF, porque, com a iniciativa, deu a entender que teme a investigação. Em nota, a assessoria do filho do presidente declarou que a solicitação foi feita tendo em vista “nulidades diversas, como a quebra dos sigilos bancário e fiscal do senador para fins de investigação criminal, sem autorização judicial”. Jair Bolsonaro não se manifestou ontem sobre o assunto.

Até agora, o núcleo político do governo tentava separar Bolsonaro de Queiroz. Mesmo assim, os militares sempre diziam que o ex-assessor deveria dar explicações o mais rápido possível para que não pairasse qualquer dúvida sobre o caso.

Em recente entrevista, o vice-presidente da República, general Hamilton Mourão, declarou que Queiroz precisava esclarecer os depósitos feitos na conta dele. “Acho que o problema é o Queiroz”, disse.

O chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno Ribeiro, chegou a afirmar que as explicações dadas por Queiroz careciam de mais “consistência”.

Vídeo
Voltou a circular nessa quinta (17/1) um vídeo publicado em março de 2017 que mostra Jair Bolsonaro, ao lado de Flávio Bolsonaro, criticando o foro privilegiado a políticos. A gravação foi publicada na conta do deputado federal reeleito Eduardo Bolsonaro.

Flávio permanece quieto o vídeo inteiro, apenas concordando com as afirmações do pai através de expressões faciais. Então deputado federal, Jair Bolsonaro critica a intenção de colegas a se reelegerem somente para se manterem protegidos pelo foro privilegiado. Bolsonaro diz que é “o único prejudicado com esse foro privilegiado”, já que renunciaria ao cargo para concorrer nas eleições 2018 à presidência da República. Ele ainda diz que não quer “essa porcaria de foro privilegiado”.

Na ocasião, Jair Bolsonaro se refere a um processo no qual é réu no Supremo Tribunal Federal por ter incitado estupro à então deputada federal Mária do Rosário (PT).

O ministro responsável pela suspensão da investigação no MP-RJ é Luiz Fux. No vídeo de 2017, Jair Bolsonaro chega a citar que um ministro do STF “que está a serviço do PT” é o responsável pelo inquérito que o acusava. O relator do Inquérito nº 3.932 movido contra Bolsonaro no caso da deputada Maria do Rosário curiosamente é Fux. No mês em que o vídeo foi publicado, em março de 2017, o STF votava acórdão contra solicitação de embargos de declaração de Bolsonaro. A gravação é uma versão editada de uma transmissão ao vivo do Facebook.

Na versão integral do vídeo, Flávio chega a confirmar que a crítica é direcionada a Fux, que, segundo ele, havia voltado atrás em sua decisão em relação à investigação contra Bolsonaro. Flávio garante que o pai não estaria inelegível para a eleição de 2018, já que as denúncias contra Bolsonaro não se enquadravam na Lei da Ficha Limpa, por volta dos 20 minutos de gravação.

Também em postagem de 2017, dessa vez no Twitter, Flávio criticou intenção de alteração na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do foro privilegiado que ampliaria o benefício para ex-presidentes, atingindo assim o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na época, Lula ainda não havia sido preso pela Operação Lava Jato e era o principal candidato do PT para concorrer na corrida presidencial de 2018.