Os corais da espécie Siderastrea stellata estão muito presentes no litoral do Nordeste e Sudeste do Brasil, país com a segunda maior costa de corais do mundo e uma grande diversidade de espécies, que contribuem para o equilíbrio do ecossistema marinho. Com base na análise geoquímica do esqueleto dessa espécie, um grupo de pesquisadores de diversas Instituições de Ensino Superior (IES) conseguiu estabelecer um modelo de equação matemática calibrada, isto é, referenciada para esse tipo de coral, que possibilita medir a temperatura da superfície do Oceano Atlântico Sul Tropical em períodos que remontam até cerca de 300 anos atrás. O estudo, que conta com a participação de um docente da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), é inédito e foi publicado recentemente por meio de um artigo no periódico Geochemistry, Geophysics, Geosystems.
Intitulado “South Atlantic Multi-Site Calibration of Coral Oxygen Isotope Paleothermometer” (Calibração Multi-Site do Paleotermômetro de Isótopos de Oxigênio de Coral no Atlântico Sul), o artigo apresenta o método desenvolvido pelos pesquisadores. Além de permitir a reconstrução paleoclimática – que é o estudo das variações climáticas ao longo da história da Terra, a equação pode ser utilizada para elaborar modelos climáticos que antecipem tendências futuras para a temperatura do Atlântico Sul. A pesquisa teve a participação do professor Renê Macêdo, do Colegiado de Ciências da Natureza, do Campus Serra da Capivara (PI).
O artigo resulta do trabalho desenvolvido no âmbito do projeto “Calibração de paleotermômetro de isótopos estáveis de oxigênio utilizando a espécie de coral Siderastrea stellata do Nordeste brasileiro: uma ferramenta para o estudo de mudanças climáticas no Atlântico Sul Equatorial”, coordenado pelo professor da Universidade do Estado da Bahia (Uneb) Natan Pereira e que contou com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A pesquisa começou em 2015 e teve a participação de 11 pesquisadores das Universidades Federais da Bahia (UFBA) e de Pernambuco (UFPE), da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Maryland, dos Estados Unidos, além da Uneb e Univasf.
A pesquisa envolveu o monitoramento de medidas de temperatura da água do mar, do crescimento de corais e a coleta de esqueletos de Siderastrea stellata. Foram coletadas amostras em três lugares do Oceano Atlântico Sul: Atol das Rocas, Tamandaré (Pernambuco) e Baía de Todos os Santos (Bahia). O professor Renê Macêdo explica que a análise geoquímica do esqueleto do animal revelou variações nas proporções dos isótopos de oxigênio depositados na carapaça ao longo do seu desenvolvimento, indicando que o animal é suscetível ao aquecimento e ao resfriamento da temperatura da água ao longo do tempo, assim como aos níveis de salinidade do mar.
“O estudo também revelou que apesar da temperatura influenciar nos valores de isótopos de oxigênio no metabolismo dos animais, a salinidade também contribui de maneira significativa. Isto é, cenários de resfriamento do clima ou aquecimento afetam diretamente as condições de temperatura e salinidade da superfície do oceano, que por sua vez, alteram a dinâmica das razões de isótopos de oxigênio estocado nos esqueletos de corais”, diz Macêdo.
O professor destaca que as equações calibradas permitirão utilizar fósseis de corais como paleotermômetros da superfície do oceano. “Isto implica diretamente na compreensão da dinâmica das águas do Atlântico Sul e das variações climáticas regionais passadas, permitindo reconstruir o paleoclima, pelo menos, para os últimos séculos para a região”, conclui.
Os corais são animais marinhos que vivem em águas rasas e são formados por pólipos, em cuja base há o esqueleto calcário do coral, que é fixo em um mesmo local até o fim da sua vida. A espécie Siderastrea stellata, estudada na pesquisa, também é conhecida como coral-estrela e é amplamente encontrada no litoral brasileiro, na faixa que vai do Maranhão ao Rio de Janeiro.